Sobre ler textos complicados

Desde que comecei a faculdade de Cinema e Audiovisual na UFF, em 2017, tenho sido levado a fazer algo que não fazia com frequência: ler textos difíceis e densos. Foucault, Jacques Aumont, Gilles Deleuze, Sergei Eisenstein, Jacques Rancière, e por aí vai. Desde o início, achei muito difícil ler a maioria dos textos, na maioria das vezes com uma redação diferente das quais estou acostumado, pantanosos e viscosos. Minha mente normalmente fica assim ao ler estes textos:


Já conversei com alguns professores e colegas de curso sobre isso mas nunca consegui descobrir uma maneira de melhorar minha relação com estes textos.

Até que no final do ano eu encontrei um vídeo com parte de uma aula do professor Clóvis de Barros Filho onde ele fala justamente sobre a leitura de textos difíceis. Ao mesmo tempo uma lição e um tapa na cara, o vídeo chegou no momento certo. Durante algumas semanas, escutava quase diariamente, enquanto fazia minhas caminhadas de volta pra casa. Seguem abaixo algumas das partes que mais me chamaram a atenção. São pouco mais de sete minutos de pura iluminação.

Sobre a forma de ler esse tipo de texto. Não é para ler de uma passada só, como uma reportagem de jornal ou um livro de ficção. É preciso remover, rever, ruminar.

"'Professor, mas três páginas leva um minuto e meio' (...) Não, não leva não. Você pega o primeiro parágrafo. Lê. Ele vai te produzir um certo desconforto. (...) Lê de novo. (...) Lê a terceira vez. Aí vai pro segundo parágrafo. (...) Gasta uma hora em três páginas. (...)"

Sobre a crença em nossa própria capacidade. É claro que certas coisas exigem mais dedicação que outras, mas se alguém já foi capaz de fazer uma coisa, outras pessoas têm as condições de repetir.

"É uma questão de brio. (...) 'Malandro, você é tosquinho, você não entende.' Nossa, eu volto pra casa (...), eu vou lá, vou botar 'Kant', vem o texto, eu vou ler. Porque? Como pode um cara escrever uma coisa que eu não entenda? (...) Eu vou ler aquela merda até entender. (...) Senão nego caga na sua cabeça e você não reage."
"Como assim eu não vou entender? Eu comi na infância! Né? (...) Cérebro, tenho o tamanho de um cérebro normal. (...) O cara escreveu, velho, você só vai entender o que ele escreveu, você imagina que ele teve que tirar do zero aquela merda toda!"
"O que todo mundo diz? 'Não, nem pega o texto, cara, isso aí é pra dois ou três.' Porra, (...) então é pra mim!"

Sobre a importância de se esforçar para ser capaz de melhorar o próprio pensamento, da mesma forma que exercitamos nossos músculos.

"Você vai dizer, 'professor, a pedagogia...', a pedagogia que se foda, você precisa sentar a bunda na cadeira e melhorar a sua capacidade de pensamento."
"Porque estudar, aperfeiçoar a capacidade intelectiva, pensar com competência, é tão esforçado quanto ter músculos (...), exige empenho, exige dedicação, exige bunda na cadeira."

Por fim, um puxão de orelha, só pra lembrar que o tempo que você perde reclamando podia estar gastando com coisas mais úteis.

"Agora pega o texto, deita, e entende. Porque, não tem como porque não entender. (...) Tem professor, tem comida, tem tudo, o resto é só preguiça e covardia."