Na minha família, do lado do meu pai, todos têm problemas de coração. Três tios meus operaram e quatro deles morreram de enfarto. Desde o início de 2002 sabíamos que meu pai já estava apresentando problemas com o seu, e ele já estava se tratando.
Em meados de 2004 as coisas começaram a piorar, a ponto de um dia de manhã eu ter que ligar para um colega de trabalho para que ele nos levasse às pressas para o hospital. Por sorte, foi apenas um susto.
Dias depois fui ao médico que tratava do meu pai para poder entender o que tinha acontecido. Dr. Raul me explicou que o caso dele era muito sério, e que ele precisava, urgentemente, operar. Com uma maquete de coração na mão, me mostrou que três das veias principais do meu pai estavam completamente entupidas. Para fechar o quadro crítico, encerrou dizendo que, das pessoas que estavam na mesma situação, 50% não duravam 6 meses.
Óbvio ululante, saí de lá tremendo e chorando. Conversei com a família, conversei com Sueli, e sentamos com seu Jorge para tentar convencê-lo a operar. Mas não adiantou. Ele bateu pé e disse que só operaria numa emergência, tal qual aquela de alguns dias antes. Ele tinha o medo, compreensível, de morrer na mesa de operação.
Restava-nos então escolher entre duas opções, ambas cruéis: convencê-lo a operar e correr o risco de perdê-lo na mesa, mas confiando no sucesso da operação; ou deixá-lo agir como queria e correr o risco de perdê-lo a qualquer momento, mas confiando no lado bom da porcentagem de chance de "sobrevida" dele.
E seguimos vivendo.
Numa quinta feira, 17 de março de 2005, cheguei em casa vindo da faculdade, jantei e fui para o computador navegar na internet. Era cerca de meia noite e meia quando nossa vizinha bateu na nossa porta dizendo que a polícia tinha passado em frente ao beco onde moramos para avisar que alguma coisa tinha acontecido com meu pai.
Sem saber ao certo o que estava acontecendo, ligamos para pessoas que tinham carro e iniciamos uma busca frenética em busca de notícias concretas, para dar fim às nossas dúvidas e receios. Só meia hora mais tarde, bem depois de uma da manhã, Nelcemir chegou com a notícia que não queríamos ouvir.
O início da madrugada foi feito então de avisar a família e começar desde logo os preparativos para o funeral. O dia seguinte foi, claro, o mais triste dos últimos tempos na minha vida. Foi uma tristeza que se arrastou pelos meses seguintes, me prejudicando em muitos pontos da minha já tão atribulada vida.
Na época, eu não quis que meus colegas da faculdade soubessem pois nem de longe eu queria passar por coitadinho. Me estrepei de verde e amarelo para estudar, inclusive para continuar a pôs as matérias no meu site, mas segui adiante mantendo o meu "segredo".
De início, apenas quatro colegas souberam, mas foi inevitável esconder a dor por muito tempo. Devo muito à Suelen e ao Douglas por terem me ouvido e oferecido o ombro para que eu pudesse chorar. Outro que soube e bateu um papo muito bom foi o Aprígio.
Nem mesmo no meu site eu mencionei o assunto. Apenas publiquei uma citação bíblica e escrevi um ou outro texto mais melancólico, mas não toquei diretamente no assunto.
Levei cerca de quatro meses para superar a dor. Não foram poucas as vezes em que ao chegar em casa eu me preocupava ao acender a luz para não acordá-lo. Tampouco foram poucas as vezes em que qualquer barulho na calçada me fazia pensar que era ele chegando. Ou então, ao ouvir uma música, não tivesse o impulso de chamá-lo para ouvir. E muito menos foi fácil deixar de sentir dor quando lembro daquele homem fechando o túmulo de meu pai e, ao terminar, dizer que "agora é só saudade".
Desse período, só tenho a agradecer aos amigos, à família e à Sueli pelo apoio. Como não agradecer a Cida pelo ombro na missa do dia das mães? Como não agradecer a minha tia Nice pelas gargalhadas em casa? Se não fossem eles, talvez eu não teria superado isso tão rápido.
Nesse tempo obscuro, a igreja foi outro bálsamo para acalmar minha alma abalada. Busquei muito e pedi muito para que Deus me desse a calma e a paz que eu sei que mereço. Mas também não foi fácil. No auge da dor, cheguei até mesmo a me afastar, negar o poder de Deus e perder a fé. Mas graças a Ele próprio minha fé se fortaleceu.
E por que escrever sobre isto agora? Por que pôr pra fora estes sentimentos e pensamentos só depois de tanto tempo? Pois só agora a dor passou. Só agora consigo escrever sobre meu pai sem chorar. Porque eu precisava botar tudo pra fora. Por que eu precisava. Por isso.
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