A Oração do Pai Nosso

A oração, todos conhecem. Mas levantem o dedo os que já interpretaram o que dizem, frase por frase. Ensinada por Jesus durante o sermão da montanha, como descrito em Mateus 6,9-13 e Lucas 11,2-4, a oração do Pai Nosso é muitas vezes repetida sem que os orantes prestem atenção ao que dizem.

Já há um bom tempo eu parei para interpretar o que ela diz. A interpretação que fiz daquela vez mudou um pouco com o tempo. Reproduzo abaixo a oração e depois sigo com minhas observações.

Pai nosso, que estás no céu,
Santificado seja o vosso nome
Venha a nós o vosso reino
Seja feita a vossa vontade
Assim na terra como no céu
O pão nosso de cada dia nos dai hoje
Perdoai as nossas ofensas,
Assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido
E não nos deixeis cair em tentação,
Mas livrai-nos do mal,
Amém.

Pai nosso (...). Sendo a oração dirigida para alguém, começa-se com uma saudação ou uma invocação, coisa que o valha. No caso, vamos pedir alguma coisa para Deus, o Pai. E ele não é só o meu pai, o teu pai ou o pai do pastor da igreja ali da esquina. É o pai de todos, o nosso pai. Até aqui ótimo, tudo certo. Agora, perdoem-me se estou errado, pois ainda não tenho tanto conhecimento bíblico assim, mas para ser chamado de filho de Deus não é preciso aceitar Jesus como o messias e ser batizado? Se for, então quem não passou por isso ainda não é filho de Deus, logo, não é todo mundo que poderia rezar o Pai Nosso.

(...) que estás no céu (...). Temos aí um sério problema teológico e, principalmente, geográfico. Onde está Deus? "Ele está no meio de nós"? Ou estaria ele em todos os lugares ao mesmo tempo? Na oração, afirmamos que Ele está no céu. Bem, se Deus é onipresente, então está em todos os lugares, estando, também, no céu. Aqui a coisa funciona.

(...) santificado seja o vosso nome (...). Dizer que Deus seja santo seria esquisito, porque o Todo Poderoso está acima disso, mas fala-se que Seu nome seja santo, o que é ainda mais esquisito. Pode um nome ser santo? Podendo, qual seria o nome a ser santificado? Deus, Javé, Jeová? Hm... complicado. Podemos deixar interpretado que isso indica uma boa dose de respeito para com Ele.

(...) venha a nós o vosso reino (...). Antes de pedir que o reino venha a nós, é preciso pensar em como seria o reino. Mas como ninguém voltou pra contar como é, pode-se acreditar no que está escrito na Bíblia. Tá, os espíritas dizem que tem gente que voltou, e contou como é, mas ainda assim são histórias e descrições muito inverossímeis. Se tomarmos que o reino de Deus é um lugar porreta, pra lá de bom, então, claro, que ele venha a nós! Deve ser melhor do que aqui.

(...) seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu (...)
. Aqui a coisa pega. Qual vontade deve ser feita? A nossa ou a Dele? A primeira coisa que me vem à mente é de dizer que seja feita a minha, afinal, a vida é minha e eu tenho o livre arbítrio. Depois paro para pensar e vejo que, sendo Deus safo como é, Ele sabe bem melhor do que eu o que é bom e o que é ruim. Então, na terra, que seja feita a vossa vontade, mas que deixe a gente escolher de vez em quando. Já no céu, é Ele que sabe como funciona, então que, indiscutivelmente, a última palavra seja Dele.

(...) O pão nosso de cada dia nos dai hoje (...). Ensinar a pescar é melhor do que dar o peixe, porque assim se alimenta alguém para o resto da vida. Logo, essa história de nos dar o pão todo dia não soa muito bem. Seria melhor algo do tipo "nos dê a cada dia a força para conseguir o pão nosso". Ou então pão está aqui no sentido figurado, e trata do corpo de Jesus. Aí sim a frase faz sentido. Que Ele nunca se afaste de nós, nenhum dia, é uma coisa pra lá de desejável. Mas ainda assim, teríamos que pedir também o vinho. Parece que a metáfora aqui não serve, inclusive porque, quando ensinou a oração do Pai Nosso, Jesus ainda não tinha falado a seus discípulos sobre a questão do pão e o vinho serem seu corpo e sangue.

(...) Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido (...). Há muito tempo, muito tempo mesmo, eu rezava dizendo "perdoai as nossas ofensas, mesmo que eu não perdoe a quem me tem ofendido", alguém me ensinara assim, mas vi que estava errado. Rezando desse jeito eu mudava o sentido da frase, pedindo que Deus passasse a mão na minha cabeça. Afinal, não importava se eu tivesse perdoado alguém ou não, o interesse era ser perdoado pelo Pai. Mas não é assim que a banda toca.

A frase pode ser interpretada como "lide com meus erros assim como eu lido com os erros dos outros". Dita desse jeito, o bicho pega, não? É praticamente "Pai, me trate como eu trato os outros". Se não perdoamos ninguém, Ele não nos perdoa, simples assim. É "amai o próximo" na veia. Jesus não era bobo.

(...) Não nos deixeis cair em tentação (...). Ou seja, não nos deixe pecar, fazer o que não presta. É compreensível pedir isso, porque tentações são coisas que nos fazem sentir arrependidos quando cedemos a elas. Mas, pô, confessem, ceder a uma tentação de vez em quando é muito bom. Mas ainda assim a gente pede pra não cair nelas.

(...) Mas livrai-nos do mal (...). Isso todo mundo quer. Que o mal vá pra longe, pro diabo que o carregue.

E que assim seja.

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