Relembrando o Português

Como o dia começou eu não tenho lembranças. Minhas memórias de quando eu tinha dez anos costumam ser bem nebulosas. Mas deve ter acontecido mais ou menos assim: acordei, tomei um café e logo depois papai me levou pra casa dos coleguinhas, pronde eu tava indo quase todos os dias.

Isso já vinha acontecendo há algumas semanas, quase todo dia eu ia pra casa desses coleguinhas e passava o dia inteiro lá. E papai me buscava à tardinha. Mas nesse dia ele me buscou perto da hora do almoço.

A partir daí eu lembro de tudo.

Entramos no fusca, ele pediu para eu esperar ali, voltou na casa dos meus coleguinhas, conversou com a mãe deles e voltou. Naquele trajeto de três minutos tivemos a nossa conversa. Enquanto a gente passava embaixo do viaduto ele me perguntou se eu sabia o que era morrer. Já passando sobre a antiga ponte do trem, eu respondi.

Eu sei, pai. Eu sabia que isso ia acontecer.
Chegando ao nosso destino, quando saímos do carro, papai me avisou.

Não se assuste com o jeito que sua mãe está deitada.
Era o velório dela.

Perdeu a esposa e teve que contar pro filho. Homão da porra, esse.

À tarde, voltei pra casa dos amiguinhos.

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