Quando comprei este livro, achei que era um romance, mas me enganei. No início do século passado, na década de 10, Lima Barreto estava muito descontente com os rumos que o Brasil estava tomando, tanto no jeito de ser das pessoas quanto na corrupção dos políticos, e começou a escrever textos sobre um país fictício - a Bruzundanga.
Escreveu várias sátiras sobre o país, que eram publicadas em jornais de grande circulação na época. Em uma sátira ele falava da religião do lugar, em outra falava das escolas, depois do lazer, e então dos políticos e por aí ia. O livro Os Bruzundangas é a compilação destes textos, aparentemente em ordem cronológica de sua publicação.
É incrível perceber como as coisas simplesmente não mudam. Não mudam mesmo. Tudo o que Lima Barreto criticava em suas sátiras acontece ainda hoje do mesmo jeito, seja no campo da cultura, com seus artistas fracos que são nomeados para a Academia Bruzundanguense de Letras sem terem publicado um livro sequer; seja na política, com seus políticos corruptos que só fazem jogo de interesses; ou então na economia, onde regiões do país são mais privilegiadas do que outras. Ele trata até mesmo da influência de pessoas ricas nas tramóias políticas.
Um dos melhores exemplos de como as coisas não mudam é o seguinte trecho: "a política não é aí uma grande cogitação de guiar os nossos destinos; porém uma vulgar especulação de cargos e propinas". Gente, isso foi há quase cem anos, e nada, absolutamente nada mudou.
Lima Barreto sacaneia de tudo quanto é jeito que pode. Quando fala dos escritores da Bruzundanga, ele os pinta como pessoas que seguem uma regra exata para a produção de textos, ou seja, não existe a liberdade de criação, mas sim um conjunto de fórmulas que devem ser seguidas para a escrita de textos e poesias. O resultado é que toda a produção literária é praticamente igual, e ai de quem inventar de fazer diferente. As duas melhores demonstrações deste pensamento são duas das "leis" que regem a criação de poesias:
"1 - Sendo a poesia o meio de transportar nosso espírito do real para o irreal, deve ela ter como principal função provocar o sono, estado sempre profícuo ao sonho.
(...)
3 - A beleza de um trabalho poético não deve ressaltar desse próprio trabalho (...); ela [a beleza] deve ser encontrada com as explicações ou comentários fornecidos pelo autor ou por seus íntimos."
Uma das poucas coisas que não mais se aplicam ao Brasil é quando ele fala de produção musical. Para a Bruzundanga, Lima Barreto não dispensou mais do que duas linhas, apenas para dizer que nenhuma música é produzida. Isso mudou bastante, todo mundo sabe.
A única coisa que às vezes atrapalha a leitura é o estilo de escrita. Apesar de as palavras terem aparentemente sido "traduzidas" para o português atual (na questão da grafia das palavras), o modo de escrever segue o estilo de antigamente, que é meio esquisito para quem não está acostumado. Mas, fora isso e algumas palavras que a gente não conhece, dá pra ler tudo com tranqüilidade.
Enfim, é um livro divertido, mas que nos faz ver como não dá pra ter muita esperança de que as coisas vão melhorar. É arriscado que daqui a cem anos alguém junte as crônicas do Arnaldo Jabor e publique um livro, só para meus netos lerem e falarem que nada mudou desde o tempo do vovô Mário. E o livro vai falar as mesmas coisas que estão em Os Bruzundangas.
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